O número de acidentes de origem elétrica vem subindo ano a ano, atingindo 1.662 ocorrências em 2019. Esses dados da Abracopel, a Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade, ficam ainda mais alarmantes quando se nota que a curva de acidentes cresceu 60% no Brasil desde 2013, ano em que a associação começou a editar o Anuário Estatístico de Acidentes de Origem Elétrica.

Somente entre 2018 e 2019, o salto de casos registrados pela Abracopel ficou acima dos 15%. Tantos acidentes, lamentavelmente, acabam provocando um número grande de mortes: 821 no ano passado por conta de choques (697), incêndios por sobrecarga de energia/curtos-circuitos (74) e descargas atmosféricas (50).

Apesar de certa inevitabilidade em alguns casos de raios, a maioria dos acidentes seria evitável se procedimentos de segurança, como a aplicação de dispositivos de proteção e a conscientização das pessoas, fossem tratados como prioridade.

Risco à vida

Conhecer os riscos é o primeiro passo para a desconstrução da negligência à segurança das instalações, não só entre moradores, mas até mesmo entre profissionais, justamente a quem se confia a prestação de um serviço tão essencial.

As instalações elétricas residenciais, comerciais, corporativas e industriais, bem como as redes de transmissão e distribuição, devem estabelecer níveis de proteção para evitar perigos evidentes como os choques, mas também para os menos perceptíveis.

Um perigoso exemplo é o arco elétrico, que ocorre quando dois polos com tensões muito elevadas conseguem romper a rigidez dielétrica de um condutor aparentemente isolante, como o ar ou o óleo, fluindo a corrente entre eles sob altas temperaturas”, alerta Ricardo Martuchi, especialista em produtos da STECK Indústria Elétrica.

As queimaduras provocadas pelo arco elétrico podem ser tão ou mais graves que as de um choque, pois além das superficiais, o caminho da corrente no corpo humano provoca diversas sequelas internas, tudo isso sem que você tenha contato direto com os polos.

O curto-circuito acontece quando condutores de polos opostos entram em contato, provocando uma corrente elétrica de alta intensidade que flui sem barreiras. Entre as principais causas de curtos estão falhas no isolamento e conexões malfeitas.

O curto é potencialmente perigoso porque ele pode originar incêndios, especialmente se ele ocorre próximo a materiais inflamáveis como os tecidos de uma cortina ou da cama. Acidentes como o do Largo Paissandu em São Paulo e o do Ninho do Urubu no Rio são exemplos trágicos de incêndios originados por curtos”, explica Martuchi.

Já a sobrecarga ocorre quando a intensidade da corrente (medida em amperes, A) empregada num circuito ultrapassa o valor da corrente (nominal) em que ele foi projetado para receber. É o que acontece quando ligamos vários equipamentos ao mesmo tempo em um mesmo circuito, sobrecarregando a fiação que pode até derreter.

Normatizações

De modo a orientar e até mesmo obrigar a aplicação de procedimentos de segurança, órgãos brasileiros e internacionais se dedicam a produzir e revisar normas reguladoras para garantir sua devida aplicação em diferentes cenários.

Tudo começa pela Norma Regulamentadora de número 10 (NR 10), que reúne os procedimentos e os cuidados necessários para garantir as melhores condições de segurança e saúde no trabalho com instalações elétricas.

Pode parecer uma obviedade, mas um dos trechos mais importantes da norma é a necessidade de se desligar o circuito antes de qualquer intervenção. Muitas pessoas morreram porque simplesmente não se certificaram disto”, explica Lucas Machado, coordenador de engenharia de desenvolvimento da STECK.

Além de medidas para proteção coletiva e procedimentos de trabalho, a NR 10 também prevê o uso de equipamentos para proteção individual (EPIs) específicos para intervenções na rede elétrica, além de ferramentas adequadas para esse serviço.

Uma das consequências da NR 10 é justamente a necessidade de sempre buscar profissionais eletricistas habilitados e capacitados para a manutenção das instalações. O faça-você-mesmo não é uma opção quando se fala de elétrica.

Isso fica ainda mais evidente na aplicação de regulações complementares, pois cada tipo de projeto precisa seguir uma ou mais normas técnicas específicas. Por mais conhecimento de elétrica que uma pessoa leiga possa ter, é provável que ela desconheça como ela deve aplicar esses conhecimentos.

Uma pessoa não familiarizada com a ABNT NBR 5410 (baixa tensão) pode simplesmente ignorar a obrigatoriedade de se proteger áreas de risco com dispositivos como o IDR e o DPS no quadro elétrico, por exemplo”, explica Raphael Vittorete, engenheiro de aplicação da STECK. “A norma exige o complemento de componentes para a correta proteção de uma instalação. Só o disjuntor não basta”, completa.

Existem normas técnicas para instalações de baixa tensão (como as residenciais, por exemplo), média tensão, além das em atmosferas explosivas, estabelecimentos assistenciais da saúde, locais de afluência de público e posto de serviço.

Prevenção

A melhor atitude enquanto cidadão é evitar que ações individuais coloquem em risco o coletivo. É por isso que não se deve descartar embalagens e outros resíduos em via pública, pois eles podem acumular a ponto de facilitar alagamentos.

O exemplo das enchentes se aplica à elétrica: não pode ser uma gambiarra com cinco tomadas conectadas à energia no seu quarto a responsável por causar um curto-circuito seguido de um incêndio que afetará o prédio inteiro.

Por mais bem protegida que uma casa possa estar, com todos os dispositivos obrigatórios previstos em quadros e painéis, tudo vai por água abaixo se o vizinho convive muito bem com fios expostos em condições precárias.

A segurança começa com a vistoria e manutenção periódica da parte elétrica, seja qual for a finalidade de uso do espaço. O retrofit das instalações é tão importante quanto a aplicação de uma nova.

A falta de proteção nas instalações elétricas pode afetar a segurança de milhões e milhões de pessoas, pois quase tudo que conhecemos hoje depende de eletricidade. Priorizar a segurança é priorizar a vida.